Publicado pela Folha Online em 13/10/2001.
Em qualquer classe social, taxa de sucesso do branco é maior; cursos de elite formam menos de 4% de pretos.
A desigualdade social não
explica sozinha o número
reduzido de pretos no ensino superior. A taxa de sucesso
dessa população no vestibular da
Fuvest é mais baixa que a dos
brancos, independentemente da
classe social.
Entre os estudantes que pertencem à classe B, por exemplo, a taxa de sucesso dos pretos é de
4,9%, enquanto a dos brancos é
de 7,4% (veja quadro ao lado).
Nas três carreiras mais disputadas da Fuvest -com maiores notas de corte-, os pretos compõem uma pequena parcela dos
aprovados. No curso de medicina,
eles são 0,2% do total, em jornalismo, 4%, e, em computação, nenhum preto classificou-se.
Os dados são da pesquisa dos
sociólogos Antonio Sérgio Guimarães, 52, e Reginaldo Prandi,
55, da USP, baseada no questionário preenchido pelos 141.253
inscritos no vestibular de 2000.
Para Guimarães, "existe uma
discriminação sutil que faz com
que o aluno negro seja desestimulado. Ela está na escola, na família,
na mídia, e é internalizada".
Cursos de elite
Os cursos superiores considerados de elite no Brasil têm menos
de 4% de estudantes pretos, entre
calouros e formandos, segundo
levantamento feito pela Folha.
No Instituto Rio Branco, em
Brasília, responsável pela seleção
e treinamento dos diplomatas
brasileiros, há dois alunos pretos,
que são 3,7% do corpo discente.
No primeiro ano de medicina
da USP, há dois alunos pretos,
que representam 1,3% do total.
No curso de administração da
Fundação Getúlio Vargas, eles são
2% dos calouros e formandos.
Os dados foram obtidos com
aplicação de questionário elaborado pela Folha. Foram utilizados
os mesmos critérios do IBGE, em
que a própria pessoa define sua
raça. O instituto usa o termo negro para referir-se ao somatório
de pretos e pardos.
Sistema de cotas
A maioria dos alunos dos três
cursos são contra a proposta de
cotas para negros em universidades públicas.
No Instituto Rio Branco, 51%
são contra a reserva de vagas no
ensino superior, 42% são a favor e
o restante não respondeu.
A quase totalidade -99%-
dos alunos de medicina da USP e
de administração da FGV
-87%- é contra a implantação
de cotas para a população negra
nas universidades públicas.
Para o sociólogo Reginaldo
Prandi, "as cotas são um caminho
artificial, mas necessário". A desvalorização do negro em nossa
sociedade só pode ser revertida
através da diferenciação de oportunidades na educação.
Já seu colega Antonio Sérgio
Guimarães acredita que o sistema
de cotas seria uma "solução muito
radical". "Correríamos o risco de
agravar a sensação de incapacidade do negro", diz.
O governo tem evitado esse debate e optou por investir na capacitação da população negra. O ministro da Educação, Paulo Renato
de Souza, anunciou recentemente
negociação de financiamento de
US$ 10 milhões com o BID (Banco
Interamericano de Desenvolvimento) para a criação, a partir de
2002, de cursos pré-vestibulares
gratuitos para negros e carentes.